Quem acha que toda brincadeira infantil tem de ser barulhenta precisa conhecer o Jogo do Silêncio, atividade que estimula a criança a permanecer por um tempo –em geral, um minuto– sem fazer nenhum ruído, para que possa prestar atenção ao próprio corpo e ao ambiente ao redor.
Em um mundo cheio de estímulos sonoros, parece inacreditável que a proposta funcione, mas Paige P. Geiger, diretora do Centro de Educação Montessori de São Paulo, afirma que as crianças adoram participar da brincadeira, que traz benefícios como o aumento da concentração, da disciplina, da tranquilidade e do autocontrole.
“O senso comum parece acreditar que uma criança feliz seja necessariamente barulhenta e bagunceira, mas isso não é verdade. Quando convidamos as crianças ao silêncio, elas se sentem muito bem, pois percebem que são capazes de se controlar e de ouvir sons que antes não ouviam, e isso gera prazer.”
O jogo foi desenvolvido pela pedagoga italiana Maria Montessori, que, no século 20, criou um método educacional conhecido por valorizar a individualidade e a liberdade da criança e estimular suas percepções sensoriais e motoras.
“Maria Montessori gostava de experimentar e, certa vez, mostrou a seus alunos como era quieto um bebê de quatro meses, desafiando-os a fazerem o mesmo. O resultado foi bastante satisfatório e, desde então, a técnica vem sendo aplicada nas escolas que seguem sua linha pedagógica em diversos países do mundo.”
Segundo Paige, a reflexão e o silêncio estão muito presentes na filosofia montessoriana. “O jogo é praticado todos os dias, às vezes, mais de uma vez. Trata-se de um momento de paz e de reflexão, que contribui para a formação de um ser humano calmo, equilibrado e focado.”
A criança tem uma percepção temporal diferente do adulto, por isso a atividade, que lembra um exercício de meditação em menor escala, dura apenas um minuto. Durante esse período, elas podem permanecer de olhos fechados, se conseguirem, ou contemplando um objeto, como uma vela ou planta.
Paige diz que, no início, a atividade pode exigir algum esforço das crianças menores, mas logo elas se acostumam e passam a gostar. “É importante frisar que o exercício não é usado para acalmar a classe, muito menos como medida disciplinar. Trata-se de uma das diversas práticas realizadas em sala de aula. Há também o tempo de cantar e de se movimentar.”
Para dar início à atividade, os professores –ou mesmo os pais– podem usar uma placa na qual se lê a palavra silêncio. “As crianças vão se aquietando, sentam-se calmamente e passam a seguir os movimentos do adulto que pode, por exemplo, apontar algumas partes do corpo, para que os alunos treinem a consciência corporal. Depois de algum tempo, nós sussurramos cada nome para que se aproximem devagar, treinando sua percepção auditiva.”
Quando o exercício utiliza uma vela, após o sussurrar o nome da criança, ela pode assoprá-la, como acontece no vídeo acima.
Paige afirma que, em um primeiro momento, as crianças prestarão mais atenção ao próprio corpo, sentindo e entendendo seus movimentos. “Aquelas que já desenvolveram essa percepção, começam a sentir o ambiente externo.”
Assim que o jogo termina, as crianças experimentam uma sensação de bem-estar e relaxamento. “Com a prática, naturalmente, elas passam a fazer menos barulho em sala de aula e também em casa, além de demonstrarem grande respeito pelo ambiente e pelos outros.”